De acordo com a pesquisa do Instituto Datafolha, divulgada em abril de 2019, 38% das mulheres com 16 anos ou mais se considera feminista no Brasil, ainda que 56% rejeitem se associar ao feminismo. A pesquisa ouviu 2.086 brasileiras/os com 16 anos ou mais (1.095 mulheres e 991 homens), em 130 municípios de todo o país, nos dias 2 e 3 de abril.
Em relação à composição social do apoio ao feminismo, podemos observar as mudanças que a 4ª onda do feminismo trouxe ao movimento de massas. As mulheres mais jovens da amostra (16-34 anos) se identificaram mais com o feminismo, 47%. As mulheres entre 35 e 44 anos, menos (30%). Há uma clara mudança geracional em curso. Também é muito significativo o dado de que entre as mulheres pretas, 47% são feministas. Entre as autodeclaradas pardas o índice é de 37% e de 36% entre as brancas. Um sinal da necessidade da abordagem interseccional entre gênero, raça e classe por parte do movimento feminista brasileiro.
Não é à toa que, depois do Carnaval, a grande manifestação política contra o governo Bolsonaro foi o Dia Internacional da Mulher, em que forte parcela da juventude foi às ruas unificada pela luta contra o governo Bolsonaro, sob o mote do #EleNão, o combate ao feminicídio e a luta por justiça pela morte da vereadora Marielle Franco. O ascenso do feminismo entre as jovens já havia sido identificado desde 2015 nos atos pelo #ForaCunha e quando Brasília protagonizou a maior Marcha das Mulheres Negras da história do país. Além disso, as ocupações secundaristas das escolas públicas, em 2016, contra a Reforma do Ensino Médio nos estados também deram sequência à nova onda de mobilizações feministas o país.
As estudantes secundaristas, inclusive, foram as principais lideranças das ocupações, que além dos protestos em defesa da educação, fortaleceram a luta pelo protagonismo político das mulheres com o mote “lute como uma garota”, contra o racismo e contra a violência de gênero e o feminicídio, através da hashtag #NenhumaAMenos.
Além disso, o estudo mostrou que entre setores mais bombardeados pela ideologia do patriarcado heteronormativo, a penetração do feminismo também é grande. Por exemplo, entre a população evangélica da amostra 30% se consideram feministas; entre as católicas elas são 40% e entre as que aprovam o governo Bolsonaro 29% se associam ao feminismo e 37% na parcela que avalia seu governo como regular. Entre as que não tem religião bem mais da metade (57% ) se consideram feministas e entre as que desaprovam o governo são 48%.
Maioria dos homens se reivindica feminista
No estudo do Data Folha, curiosamente a avaliação do feminismo é mais positiva entre os homens que entre as mulheres brasileiras. Para 48% deles, o feminismo traz mais benefícios que prejuízos às mulheres, enquanto 41% vêem mais prejuízo que benefício. Entre as mulheres, há empate técnico: 43% dizem que há mais benefícios e 41%, mais prejuízos. A parcela de homens que apoiam o feminismo também supera a de mulheres que se consideram feministas. Eles são maioria (52%); elas, minoria (38%).
Este dado, entretanto, deve ser tratado com muito cuidado, pois dizer que apoia o feminismo em uma pesquisa de opinião, no caso dos homens, não faz ninguém menos machista, é uma posição passiva que pode ser bastante cômoda para não ser taxado de machista e poder sê-lo tranquilamente. Por outro lado, considerar-se feminista, no caso das mulheres, é uma tomada de posição ativa frente à sociedade, na prática, significa quase um engajamento. O dado mais relevante, portanto, é a conquista de quase 40% das mulheres para a simpatia com a causa feminista.
Vale lembrar que há quase dois anos, em 8 de março de 2017, a Ipsos divulgou uma pesquisa que ouviu pessoas de 24 países para elaborar o relatório Global Advisor, focado nos temas do feminismo e igualdade de gênero. Os resultados mostravam que a situação das brasileiras era preocupante: 41% das entrevistadas no país confessavam ter medo de se expressar e de lutar pelos seus direitos. Esse percentual era bem maior do que a média global, que ficava em 26%. As mulheres do Brasil ficavam atrás apenas das indianas (as mais receosas em brigar pelos seus direitos, com 54%) e das turcas (47%).
Certamente a luta feminista em diversos terrenos da vida social está construindo caminhos para que as mulheres sintam-se mais seguras e mais representadas para lutar pelos seus direitos, seja pela conquista de maior participação feminina na política (hoje já somos 15% no Parlamento) seja pelo fortalecimento das lutas sociais por igualdade de gênero e salarial, pelo fim da cultura do estupro e feminicídio, contra os cortes na educação e Reforma da Previdência.
Diante de um governo reacionário e autoritário que quer impor um retrocesso de anos do que já foi conquistado nos direitos das mulheres é central o papel da luta feminista na construção de uma ampla resistência democrática, catalisando a enorme energia transformadora já reunida pela luta das mulheres até aqui.