Ao longo dessa terça-feira, 1º de dezembro, a deputada Fernanda Melchionna, ao lado do ex-árbitro de futebol e ativista antirracista, Márcio Chagas, participou de uma série de atividades que compõe a agenda da comissão externa da Câmara dos Deputados, integrada por parlamentares, negros, que acompanha as ações de investigação do assassinato de João Alberto Ferreira, ocorrido em 19 de novembro, no Carrefour em Porto Alegre.
Além de prestar condolências e solidariedade aos familiares de João Alberto, entre os quais estava o pai e sua companheira Milena, a deputada também acompanhou a reunião com a bancada de Vereadores negros recém-eleitos de Porto Alegre e movimentos sociais, com a Defensoria Civil Pública do RS, Superintendência Regional da Delegacia de Polícia Federal no RS, governador Eduardo Leite e Presidência do Tribunal de Justiça do RS.
“Beto foi vítima de uma execução brutal, crime que não pode ficar impune, por isso cobramos hoje o governador Eduardo Leite para que o Inquérito diante desse crime seja rápido e que não só a empresa privada que terceirizava o serviço de segurança pública, mas também o Carrefour seja responsabilizado. Nós queremos também que o Estado, além da autuação desse crime como homicídio qualificado, reconheça também o crime de racismo”, apontou Fernanda.
Márcio Chagas também lembrou que o assassinato de Gustavo Amaral, que já completou 7 meses teve como desfecho do inquérito a absolvição do policial sob a justificativa de legítima defesa. “O racismo é o crime perfeito: quem denuncia se torna o vilão e quem comete se torna a vítima. Esse espancamento nunca aconteceria se fosse uma pessoa não-negra. Hoje, infelizmente, nós estamos aqui novamente lutando por mais um corpo negro, vítima do racismo estrutural. E há quem diga ainda que não existe racismo no Brasil”, disse.
Fernanda também complementou que a não punição desse policial que assassinou Gustavo Amaral é um salvo conduto para matar. “Não adianta o governador Eduardo Leite reconhecer o racismo estrutural, mas não enfrentar estruturalmente e punir esses agentes da segurança pública. Queremos ações práticas, e não apenas simbólicas”, disse.
Na reunião junto à Defensoria Pública do RS, Fernanda lembrou que a Lei Orgânica de Porto Alegre possui, em seu artigo 150, uma penalidade administrativa que prevê multa e a cassação do alvará de estabelecimentos comerciais que praticam atos de qualquer tipo de discriminação (racial, sexual, de gênero ou por deficiência, por exemplo), mas que não é posta em prática. “É preciso de um ajustamento de conduta do próprio município de Porto Alegre, que, na prática, não cumpre o que está previsto no artigo 150, ignorando uma lei que deveria coibir atos discrimatórios”, pontou.
Como um dos objetivos da comissão externa, Fernanda também reforçou a necessidade de avançar em uma legislação antirracista, que enfrente de forma mais central o racismo estrutural. Na última semana, a deputada protocolou um projeto de lei para reconhecer a responsabilidade objetiva das empresas privadas pelos crimes de racismo cometidos em seus estabelecimentos, seja por seus empregados, seja pelas empresas prestadoras de serviço. O PL é uma resposta ao caso de racismo que culminou na morte de Beto.
Em reunião da Comissão Externa, a Superintendência Regional da Delegacia de Polícia Federal no RS informou que os trabalhadores de segurança do Carrefour contratados pela Vector Terceirização de Serviços eram, na verdade, fiscais de prevenção de perdas (vigilância não armada). Isso quer dizer que não tinham treinamento específico para realizar a vigilância patrimonial, nem autorização para uso de armamento. “São trabalhadores que obviamente recebem salários mais baixos. Uma irregularidade atrás da outra que revela muito para além do racismo: a precarização das relações de trabalho e a sanha de lucrar sempre um pouco mais.”, disse.
A deputada colocou a necessidade de garantir a fiscalização do Estado sob essas empresas terceirizadas de segurança privada, que, muitas vezes, atuam de forma irregular, e combater o conflito de interesses que há entre o público e privado quando vemos uma empresa de segurança privada, como a Vector, ter em seu quadro de sócios uma agente de segurança do estado assim como o fato de um dos funcionários da empresa ser policial militar temporário.
“Reconhecer que vivemos na capital mais segregada racialmente do país e o racismo estrutural é um passo também importante nessa luta por Justiça por Beto e sua família, que sofre uma perda irreparável. A luta por Justiça também é urgente para que a impunidade diante desse assassinato não impere e fortaleça o combate ao racismo estrutural e institucional no Brasil, finalizou.