Unidade não é adesismo: os mesmos métodos levam aos mesmos resultados

A eleição municipal de 2020, a primeira pós-eleição de Bolsonaro, será, na prática, um plebiscito sobre a agenda reacionária do governo. O resultado eleitoral em todo país em 2020 será um diagnóstico (ainda que distorcido pelas máquinas eleitorais e pelo poder econômico) da musculatura política e social que Bolsonaro terá para avançar ou não na […]

17 jan 2020, 17:13 Tempo de leitura: 5 minutos, 24 segundos
Unidade não é adesismo: os mesmos métodos  levam aos mesmos resultados

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A eleição municipal de 2020, a primeira pós-eleição de Bolsonaro, será, na prática, um plebiscito sobre a agenda reacionária do governo. O resultado eleitoral em todo país em 2020 será um diagnóstico (ainda que distorcido pelas máquinas eleitorais e pelo poder econômico) da musculatura política e social que Bolsonaro terá para avançar ou não na restrição das liberdades e no aprofundamento da agenda econômica antipovo que tem em comum com Eduardo Leite e Nelson Marchezan.

A estratégia da extrema-direita é fechar o regime político por dentro do próprio sistema. Em 2019, levaram adiante esse plano, mas não tudo o que almejavam. Aliás, estão perdendo apoio graças à oposição social, principalmente da juventude, dos estudantes, das mulheres e do mundo cultural. Entretanto, na ausência de uma forte oposição política, sobretudo o fato de que os partidos com mais força da oposição não conseguem se apresentar como alternativa e novidade, Bolsonaro segue cavando e tentando se impor. Mas nós também estamos firmes e apostamos na razão e na vitória da luta. O povo não aceita a extrema-direita. E as eleições de 2020 serão uma batalha importante nesse sentido.

Nesse cenário, o PSOL – que se construiu como uma esquerda autônoma e independente nos anos de governo do PT e do PCdoB – apresentou duas fórmulas que podem reunir e unificar os partidos e movimentos de esquerda em Porto Alegre. A primeira delas, já realizada em muitos países por distintas esquerdas, a construção de prévias. Por meio delas, ativistas, militantes, partidos e movimentos poderiam submeter seus nomes e suas propostas para resgatar Porto Alegre da desertificação neoliberal e dos governos que privatizam, restringem e desrespeitam direitos do povo.

Mais do que uma fórmula que permita reunir todos e construir uma chapa forte para enfrentar Marchezan, essa proposta é uma forma de chamar a cidadania a participar, empoderar a cidade, apostar na democracia real e fortalecer a disputa nos territórios. Uma das coisas que mais indignam as pessoas é que elas são consideradas objetos da política, não sujeitos. Os políticos tomam decisões importantes, que afetam diretamente a vida das pessoas, mas elas nunca são chamadas a decidir. Para enfrentar estes tempos, é preciso uma nova esquerda. Nova em forma e conteúdo para resistir à direita, mas também para propor um programa alternativo e de enfrentamento ao capitalismo e suas desigualdades.

A proposta de prévias seria fundamental nesse sentido. Desde 15 de maio, estamos defendendo isso. O PSOL, com quase 13% dos votos da eleição de 2016 através da candidatura de Luciana Genro, com uma bancada combativa de vereadores (Alex Fraga, Karen Santos e Roberto Robaina), com a liderança de oposição com Robaina em 2019, com uma figura pública com a capacidade e a história de Pedro Ruas e com a minha trajetória e votação significativa para deputada na Capital, não fugiu dessa responsabilidade. Mesmo sem respostas do PT e do PCdoB, seguimos insistindo na necessidade de avançar nas prévias ou em uma solução negociada para que se compusesse a chapa com as vertentes reais da esquerda.

Na ausência de respostas, por unanimidade partidária, meu nome foi indicado para concorrer às prévias ou à eleição municipal. Mesmo assim, sempre alertei que meu nome não seria empecilho para unificar as esquerdas. Ao contrário, pela minha experiência nas lutas da cidade e como líder da oposição em 2017, creio que a confluência sempre é possível. Mas confluência significa liberdade de crítica e de ideias e síntese nas proposições.

Para isso, um amplo processo de debate com a cidade e a confluência das esquerdas seriam fundamentais. Mas política é feita de gestos. O chamado de um Congresso do POVO – organizado pelo campo PCdoB e PT sem consultar e construir as bases para se avançar em método democrático e um programa alternativo para Porto Alegre – já é a demonstração de uma política. A notícia da indicação de Miguel Rossetto (PT) para compor a chapa como candidato a vice é, na prática, o encerramento das negociações e da possibilidade de confluência das distintas esquerdas. Uma política que fala em unidade mas exige adesismo a uma fórmula e uma chapa que expressam apenas um campo da esquerda. Para nós, a unidade é uma necessidade, mas unidade não é adesão. Menos ainda adesão a prato feito, fórmulas conhecidas e já experimentadas.

As velhas fórmulas de autossuficiência levarão aos mesmos resultados de 2018 ou mesmo 2016, quando direita e extrema-direita foram ao segundo turno. Uma nova esquerda precisa ser crítica e autocrítica, capaz de, sem arrogância e sectarismos, encontrar as sínteses necessárias para se reencontrar com o povo.

Porto Alegre precisa:

  • urgentemente revogar o conjunto de maldades implementado por Marchezan através de um resgate dos mecanismos de participação populares;
  • um governo do povo, sem privilégios e mordomias, com salários de prefeito e secretários alinhados com os salários dos professores da rede municipal;
  • um governo que combata a corrupção, fiscalizado por um conselho externo com plenos poderes para investigar. Prefeito e secretários que abram mão do sigilo bancário e fiscal e publicizem anualmente sua evolução patrimonial;
  • um governo ancorado na mobilização social, no qual a democracia direta seja o principal instrumento de tomada das principais decisões de interesse da cidade; que reconstrua e amplie os mecanismos de participação e devolva a autonomia e a deliberação para os conselhos e os recursos para os fundos municipais;
  • um governo que respeite e governe com o funcionalismo, revogue os ataques à carreira dos municipários, não atrase salários, crie uma empresa pública para manter o atendimento do PSF e os empregos dos trabalhadores do IMESF e abra diálogo permanente sobre condições de trabalho e salário.

Vamos, é claro, seguir batalhando pela unidade. Por isso, nossa proposta de prévias segue, assim como a disposição de sentar, conversar, buscar caminhos. Mas nossa luta por uma alternativa também passa por afirmar nossa candidatura.

Artigo originalmente publicado: https://www.sul21.com.br/colunas/fernanda-melchionna/2020/01/unidade-nao-e-adesismo-os-mesmos-metodos-levam-aos-mesmos-resultados/